segunda-feira, dezembro 06, 2010

Catharsis

Em tempos de paz convém ao homem serenidade e humildade, mas quando estoura a guerra deve-se agir como um tigre.
(William Shakespeare)

É até hipérbole eu ficar falando sobre a verdadeira guerra civil que tá rolando no Rio de Janeiro. Mas dane-se, resolvi escrever sobre isso do mesmo jeito porque me sinto revoltada, sinto uma catarse.

No Brasil como um todo, não só no Rio de Janeiro, a maioria das pessoas costumam relacionar favelas com traficantes, com drogas, com violência. Ta certo que tudo isso está presente nas favelas, mas está presente em todo o lugar atualmente... ou vai me dizer que no lugar onde você mora nunca aconteceu nada demais? Nas favelas tem muita gente trabalhadora. Gente que acorda 4 horas da manhã, desce o morro para trabalhar ou atrás de emprego (e raras vezes consegue por falta de escolaridade, que é um erro do governo), passa o dia batalhando no Sol quente, muitas vezes longe de filhos (que crescem criados por creches onde as funcionárias os tratam como animais em alguns casos), sobem o morro nas últimas horas da noite, esgotados, ainda têm que fazer alguns deveres em casa e dormir (ou pelo menos fechar os olhos e tentar) constantemente preocupados se acordarão vivos no outro dia ou não, já que a segurança é constantemente posta em risco devido à guerra civil que sempre existiu. Entre policiais e traficantes. Se você pensa que aquela anarquia toda que todo mundo sabe que está rolando começou só dia 28/11, você está muito enganado. Aquilo foi só o ápice de uma guerra eterna. Que a mídia irá esquecer, dentro de semanas ou meses ninguém nem vai ouvir falar do que aconteceu / está acontecendo lá. Mas e os moradores? E os que batalham por seus direitos todos os dias?

Eu pelo menos já estou cansada de ouvir pessoas falarem que os moradores de favela ocupam "áreas de risco". Que eles moram em "lugares onde não deveria haver residências". Para onde mais eles iriam, alguém me responde? Já percebeu que a maioria das favelas do Rio são cercadas por bairros nobres? Essas pessoas vivem nas favelas por falta de opção, já que muitas vezes eles mal tem o que comer. Enquanto isso os palyboys dos bairros nobres caminham pela praia, andam sob o Sol tranquilamente, saem com seus carros importados pelas ruas da cidade e dormem em paz. Assistem de camarote a tragédia toda se desenrolar na janela de sua casa, já que a visão de sua casa é da favela. Mas ele não se importa, porque está vestido em seu pijama de seda, deitado em seu sofá caro, tomando uma bebida importada, assistindo sua televisão de várias polegadas. Os tiros que se ouve ao fundo para ele são parte do filme de ação que ele assiste em seu caríssimo Home Theater. Ele não se preocupa, pois a guerra que está ao lado nunca chegará até ele, porque ele é protegido. Do Estado, da polícia.

Com tantas coisas ruins acontecendo, fica cada vez mais difícil acreditar que até no lixão nasce flor. Essa guerra não vai parar. Aquele povo do Complexo do Alemão está vivendo um Tropa de Elite em 3D high definition, onde nunca vai ter um "the end" pra salvar. E eu ainda sou obrigada a ver na televisão que alguns moradores da favela são vândalos. Pelo simples fato de que eles entraram na casa dos traficantes (que, por sinal, era como as outras por fora, mas um luxo por dentro. Cheio de jóias caras e artigos de luxo) e quebraram tudo. Comeram a comida, pularam na piscina (já que alguns nunca tinham entrado em uma antes), destruíram os móveis enquanto os policiais investigavam o local. E eu acho o que eles fizeram certíssimo. Justo. Esses caras vivem no luxo às custas da paz que roubaram dos moradores. Enquanto os moradores passam o dia todo trabalhando, lutando para conquistar e manter o pouco que tem, os traficantes ganham dinheiro fácil, o gastam com jóias, arregalias, mulheres, drogas. E quer saber? Eu, se estivesse com esses moradores, destruiria TUDO também. Você não?

Um comentário: