domingo, dezembro 26, 2010

A alegria durante a jornada

Estava lendo o livro que peguei emprestado do meu querido amigo Mario e relembrando todas as mensagens contidas nele. Todas foram maravilhosas para mim, mas essa que estou postando me tocou de maneira especial. Espero que gostem e entendam a verdadeira lição dessa história. ;)

Ela sentou-se no 14E e eu no 14D.
Ela era do campo e eu da cidade. Ela era retrógrada e eu mais sofisticado. Ela era familiar e eu "profissional". Mas ela podia ver e eu era cego.
_Eles colocam esses assentos muito perto uns dos outros, não é? - ela disse quando eu me sentei.
Sua face estava cerca de 25 centímetros da minha, tinha bochechas de bassê, as sobrancelhas se juntavam sobre o nariz e a papada dobrava. Sorria tão escancaradamente que dava para ver a cavidade do céu da boca. O pescoço parecia formar um ângulo de 45 graus com os ombros, deixando a cabeça caída mais para frente do que onde realmente deveria estar. Ela usava um corte de cabelo chanel e uma calça de veludo azul.

Não sei se era velha ou parecia velha, mas o que eu sei é que ela nunca tinha voado.
_Eu não faço muito disso, você faz?
Quando eu lhe disse que fazia, seus olhos se espantaram:
_ Oh, deve ser muito dive-vertido - acrescentava uma sílaba a qualquer palavtra.
Esmoreci por dentro, já estava de mau humor. Minha semana tinha sido agitada, o avião estava atrasado e superlotado. Eu estava com dor de dente e tinha deixado o remédio no hotel. Queria dormir, mas tinha que trabalhar, e agora, estava sentada perto da mãe do Frankestein.
_Oh, meu, olhe aquilo lá!
Ela apontou para o avião a nossa frente na pista.
_Este aqui é tão grande quanto aquele?
_Sim, - respondi rapidamente esperando que ela percebesse que eu não estava para conversas, mas não era tão grande, não.
_Vou encontrar meu filho em Dallas. Você já foi para lá? Acho que ele está bem. Ele teve um problema de estômago na semana passada. Ele comprou um cachorro, mal posso esperar para ver, é um labrador. Você conhece essa raça? Eles são bem grandes e adoráveis.
Ela era estranha, não somente acrescentava sílabas às palavras, mas também respondia suas próprias perguntas.

Enquanto estávamos decolando, permaneceu quieta. Por alguns momentos ela não disse uma palavra. De repente, emitiu um som que parecia chamar uma manada de porcos para comer:
_Uiiiiiiiiiihhhhh, aquelas árvores lá embaixo parecem formiguinhas!
As pessoas sentadas perto de nós se viraram e ficaram olhando como se eu fosse o presidente da república.
_Que rio é aquele?
Eu lhe disse que não sabia, então ela chamou a aeromoça. Quando as bebidas vieram, pedi um copo de refrigerante; ela pediu o cardápio.
_Fale novamente o que vocês têm. - então a aeromoça disse mais uma vez - Oh, é tão difícil escolher. - deu uma risadinha tímida e, depois de um tempo, escolheu.
Quando trouxeram a bebida dela, espantou-se por não saber que suco de maçã vinha em latas. E, depois, na vez do sanduíche, ela abriu a caixa e gritou bem alto para que até o piloto ouvisse:
_Por que será que sempre colocam maionese no sanduíche?
Quando eu abri meu computador no colo, ficou fascinada:
_Não é o máximo?

E isso se estendeu... por todo o vôo. Não deixava passar nada: se não estava olhando pela janela, estava maravilhada com a revista. Se não estava falando, estava exclamando por ter visto algo interessante. Ela brincava com o ventilador, ligava e desligava as luzes, mexia no cinto de segurança. saboreava o almoço. Quando tivemos uma turbulência, olhei para ela a fim de verificar se estava tudo bem, e ela estava sorrindo. Você provavelmente pensaria que ela estivesse andando de carruagem num conto de fadas!
Na metade da viagem, percebi que a única pessoa que estava aproveitando a jornada era ela.
O restante, nós, éramos muito adultos para nos divertir. O homem na minha frente discutia sobre viagem de negócios ao Japão, citando mais nomes do que a pesquisa do censo. O companheiro atrás estava pedindo algumas cervejas, duas por vez. A senhora, a minha direita, estava mergulhada em papéis de trabalho e eu estava olhando para a tela do computador, com os olhos cansados, a boca doendo, estressado, tentando encontrar uma mensagem para pessoas esgotadas e ignorando a mensagem sentada bem ao meu lado.

E eu quase não notei que ela se inclinou para mim e me disse, no fim do vôo:
_Meu filho, pode não ser uma boa hora para lhe dizer isso, mas você trabalhou a viagem inteirinha. Precisa descansar, rapaz. Precisa esquecer essa máquina e aproveitar a viagem.
Ups!
Dei um sorriso amarelo e resmunguei uma desculpa sobre a necessidade de ter o trabalho pronto para amanhã. Mas ela não estava ouvindo, estava esfregando a mão de tanta alegria, enquanto aterrisávamos.
_Não foi uma viagem dive-vertida? - perguntou ela quando estávamos descendo do avião.
Eu não disse nada. Só mexi com a cabeça e sorri. Ela caminhou, entremeando-se pela multidão com aquele jeito de sessenta anos. Fiquei observando-a o tanto que pude, então virei-me para pegar meu segundo vôo com a lição aprendida.
Resolvi manter meus olhos abertos.
Pensei comigo mesmo: não há vantagem nenhuma em fazer a viagem e perder a jornada.

(Um dia na vida Jesus, cap. 5 - Max Lucado)

Nenhum comentário:

Postar um comentário